seis meses após mutirão oftalmológico em campina grande, 64 atendidos e muitos com sequelas

Seis meses após mutirão oftalmológico em Campina Grande, 64 atendidos e muitos com sequelas

Mutirão oftalmológico de 15 de maio em Campina Grande deixou pacientes com infecções e sensação de desamparo

Seis meses após o mutirão oftalmológico realizado em 15 de maio no Hospital de Clínicas de Campina Grande, pacientes antigos participantes denunciam sequelas permanentes, falta de assistência e incerteza sobre responsabilidades. Naquele dia, 64 pacientes foram atendidos, e, segundo relatos e levantamento inicial, quase metade apresentou problemas na visão.

Sequelas e relatos de pacientes

Alguns pacientes continuam a conviver com limitações graves. A aposentada Nauta Caetano, de 73 anos, relatou que ainda tem dificuldades para executar tarefas básicas em casa, e disse, literalmente, “Dentro de casa é um sufoco, derramo as coisas, não vejo nada direito. Vejo a pessoa, mas não sei quem é, ela fala comigo, mas conheço pela voz, não vejo direito. Não leio mais”. O sobrinho de Nauta, Douglas Batista, contou que antes do procedimento a tia era independente, e disse, na mesma transcrição, “Você vê a vida dela virar de cabeça para baixo como da gente que é família também, a gente não quer passar por isso também. Uma pessoa 100% ativa está dependendo de todo mundo hoje pra tudo”.

A professora Errta Riany descreveu um quadro abrupto logo após a aplicação, afirmando, “No dia seguinte acordei com fortes dores, sem enxergar, saindo um líquido, um pus, automaticamente também não consegui abrir o olho direito. Eu andava como uma pessoa cega”. Ela ainda relatou ter recebido diagnóstico de perda progressiva da visão, atribuindo isso às sequelas do procedimento.

Outro caso é o de Marinildo Pereira, de 59 anos, que afirmou não ter sido procurado por nenhuma instância pública após o mutirão, e descreveu sua atual condição, com as palavras, “Governo nenhum me procurou para saber como eu estou, se estou precisando de alguma coisa, não passei necessidade porque tem meus filhos. Hoje meus olhos são os dedos, fico tateando (…) meu caso é irreversível, não tem mais jeito”.

Contratação, responsáveis e investigação

O mutirão oftalmológico foi realizado por contratualização via programa Opera Paraíba, com a licitação vencida pela Fundação Rubens Dutra Segundo. A execução foi repassada à oftalmologista Naiara Cavalcante Furtado, que, segundo o Ministério Público da Paraíba, foi a médica responsável pelos procedimentos no Hospital de Clínicas.

Parte das vítimas já ingressou com ações judiciais contra a Secretaria de Saúde e a Fundação Rubens Dutra Segundo, enquanto a Polícia Civil segue com investigação. O delegado Renato Leite aguarda o resultado de laudos periciais para concluir o inquérito, e informou que só irá se pronunciar quando todas as análises estiverem finalizadas. O Ministério Público da Paraíba também acompanha o caso.

Posicionamentos oficiais

A Secretaria de Saúde da Paraíba, a SES, informou que “os pacientes seguem em acompanhamento, com avaliações periódicas e boa evolução no tratamento”. A Fundação Rubens Dutra Segundo declarou que está à disposição das autoridades, e que exames contratados por conta própria apontam que “as infecções foram provocadas por bactérias hospitalares”. A equipe jurídica da médica responsável pelos procedimentos não quis se manifestar, e o Conselho Regional de Medicina afirmou que acompanha a situação.

A Sociedade Brasileira de Oftalmologia emitiu nota ressaltando que mutirões são medidas excepcionais e devem ocorrer apenas quando houver justificativa técnica e incapacidade da rede regular de atender a demanda. A entidade ainda reforçou que “infecções pós-operatórias geralmente decorrem de falhas nos protocolos de esterilização, controle ambiental ou supervisão técnica”, apontando áreas comuns de risco em campanhas de grande volume, quando os procedimentos e a logística não seguem protocolos rigorosos.

Impacto social e próximos passos

Além do impacto individual, as histórias descritas mostram efeitos sociais, com famílias tendo que reorganizar cuidados e rotina para atender pessoas que antes eram autossuficientes. Pacientes afirmam sensação de desamparo por falta de acompanhamento assertivo e acusam ausência de assistência imediata após a piora clínica.

Enquanto as perícias e investigações seguem, especialistas consultados lembram que campanhas oftalmológicas devem conjugar triagem precisa, ambientes esterilizados, controle de qualidade e planos de acompanhamento pós-procedimento. A combinação de relatos de múltiplos pacientes, exames particulares que apontam infecções por bactérias hospitalares, e o acompanhamento por órgãos como o Ministério Público e o Conselho Regional, indica que o caso terá desdobramentos judiciais e administrativos relevantes.

Moradores e pacientes que participaram do mutirão continuam buscando respostas, reparação e garantias de cuidado continuado, enquanto autoridades esperam resultados de laudos para definir responsabilidades e possíveis medidas para evitar novos episódios semelhantes.

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